Por Ítalo Milhomem
O deputado federal reeleito Marçal Filho (PMDB-MS) afirmou que recebia propinas de obras realizadas com suas emendas parlamentares. A declaração foi dada pelo deputado no dia 14 de junho de 2010, em uma gravação realizada pelo ex-secretário de governo de Dourados, Eleandro Passaia, durante as investigações da operação Uragano da Polícia Federal para desmontar um esquema de corrupção que ocorria no município.
Conhecido por sua voz galanteadora das rádios douradenses, Marçal conversou com Passaia sobre os “retornos” financeiros de suas emendas, que seriam utilizadas na sua campanha de reeleição de deputado. A conversa foi gravada no próprio estúdio da rádio, onde o deputado trabalha, em um intervalo da conversa com Passaia, Marçal chega a fazer uma chamada ao vivo em seu programa.
Durante o diálogo, Passaia alerta o deputado, que devido aos preços licitados em uma das obras realizadas com uma de suas emendas, não seria possível pagar propina pela empreiteira contratada, pois o Tribunal de Contas poderia desconfiar se algo fosse superfaturado.
“O Geraldinho (da empreiteira Planacon) te explicou, que se a gente for licitar essas coisas ali... ele não vai poder te repassar nada. Quer dizer, emenda que você colocar pra isso não vai ter... Não vai ter 10%, nem 5%”, alerta Passaia.
Marçal responde que entende a situação e este é o maior problema que ele tem.
“Não vai... É um problema, tchê. É um problema. Esse é o problema. Mas isso aí, essa questão das minhas emendas, nem problema do ARI é. Todo mundo sabe que a partir do momento que você coloca a emenda... A questão é o seguinte: as minhas emendas não têm nada a ver com o Ari (Artuzi). minhas emendas todos sabem... o cara tem que dar um retorno pra mim, Passaia”, a partir deste momento, Marçal realiza uma chamada ao vivo na rádio.
Empréstimo
Marçal ainda pediu que Passaia intermediasse um empréstimo de R$ 2 milhões com o até então prefeito Ari Artuzi (PMN). Diante a negativa do empréstimo, Marçal brinca, e diz que não falta dinheiro a Artuzi, que isso é mentira, pura conversa para eleitor ouvir.
“Passaia, o ARI tem dinheiro, PASSAIA. É a terceira vez que eu sou deputado federal, sabe. Então vocês não vêem com essas conversas aí, terceira vez que sou deputado federal. Se eu tivesse sido quatro anos deputado federal ele tinha cinco milhões pra campanha, e não só dois (milhões). Então, essas conversas de vocês aí não colam, entendeu? Esse negócio de conversar é conversa pra eleitor. É igual conversa do (deputado federal) Geraldo Resende (PMDB): Hã, eu não tenho dinheiro, não tenho dinheiro, to fudido, não sei o que... Pára, o cara é há oito anos (deputado). Ele não tem porque depois que entra no bolso da gente fica duro pra tirar...”
Uma semana depois da primeira conversa, os dois se encontraram novamente. Passaia pergunta como está a pré-campanha de reeleição, o deputado comenta que está feia, sem dinheiro, e que a fonte de três esquemas tinha secado antes mesmo do início oficial da campanha.
“Se eu estivesse há oito anos (na Câmara) como os caras estavam, tinha feito caixa, bastante. Eu nem ia conversar com o André (Puccinelli), da condição de ficar passando raiva com André. O problema é que eu não tenho. As únicas emendas que eu peguei foram ano passado para esse ano. Não conseguem uma antes da eleição”, desabafou Marçal.
O deputado federal ainda reclama que não tem conseguido nenhum adiantamento de suas “comissões” de suas pagas pelas emendas parlamentares, pois somente foram empenhadas, mas nenhuma teria sido paga ainda.
“Dinheiro, não saiu dinheiro nenhum, o que sai é empenho, né? Como saiu os empenhos eu fui tentar falar com o .... para ver se eles adiantavam, não adianta. Se eu arrumasse quem adiantava. Eu tenho R$ 12,5 milhões, pelo menos R$ 1 milhão se fosse 10%. Pelo menos dez por cento”, comenta Marçal o valor que ele embolsaria para campanha caso suas emendas tivessem sido pagas.
De acordo com os dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) apurados pela reportagem do Inconsenso, em 2006 quando se candidatou ao cargo de deputado federal, Marçal arrecadou e gastou R$ 376.660,00. Na eleição posterior, em 2010, quando foi reeleito para o cargo por mais quatro anos a arrecadação para campanha dobrou para R$ 896.276,09.
STF
As conversas gravadas por Passaia com Marçal nos dias 14 e 21 de junho de 2010 motivaram o pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel da abertura do inquérito 3352 no STF (Supremo Tribunal Federal), que investiga as condutas do parlamentar, que foram enquadradas como crimes praticados por funcionários públicos contra a administração em geral e por corrupção passiva.
A reportagem do Inconsenso entrou em contato com deputado Marçal Filho (PMDB-MS), que por meio de sua assessoria de imprensa respondeu que ainda não teve acesso ao inquérito 3352, que corre do Supremo Tribunal Federal e nem das investigações da operação Uragano, em que teve seu nome citado.
No entanto, Marçal repudiou as acusações, que ele qualifica como mentirosas. O deputado ainda afirma que as gravações foram ilegais e tinham como única motivação sujar o nome de pessoas inocentes. Por fim, o parlamentar comenta que se coloca à disposição da Justiça para qualquer esclarecimento, de modo que não fiquem dúvidas do seu comportamento, sempre exemplar, de homem público.
Outra ação
Marçal Filho é investigado pela Ação Penal 530 no STF (Supremo Tribunal Federal) por conta de falsidade ideológica, por supostamente ter colocado a administração da rádio 94 FM Dourados em nome de laranjas para concorrer ao mandato de deputado federal. O processo estava sob a relatoria da ministra Ellen Gracie, que recentemente se aposentou e deverá ter novo relator.
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